
Diferentemente de Lívia, a técnica de enfermagem Damiana Negreiros (PDT) buscava reeleição para o seu segundo mandato como vereadora da cidade. Ela se candidatou primeiramente em 1996, mas só conseguiu ser eleita pela primeira vez em 2000, perdeu novamente em 2004 e decidiu concorrer mais uma vez em 2008, onde ficou em quinto lugar. Nesse período, Damiana vivenciou o “boom” das candidaturas femininas em Jaguaribara. Já com a vigência da lei eleitoral que obriga os partidos a incluírem mulheres, as candidaturas femininas passaram, a partir dali, a exercerem papel simbólico e ao mesmo tempo estratégico nas contendas eleitorais do município.
Hoje, após 15 anos da eleição da primeira prefeita, Jaguaribara é o município do Vale do Jaguaribe com a maior representatividade feminina nas Câmaras Municipais da região, segundo levantamento realizado pelo Jaguaribara em Foco com dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE). Apesar do eleitorado jaguaribarense ser composto por 52% de mulheres, na última eleição apenas 12 mulheres se candidataram à Câmara Municipal e dessas mais da metade obtiveram menos de 17 votos. Algumas candidatas não obtiveram sequer o próprio voto.
Lohanne Oliveira (PSB), uma das mais jovens candidatas nas eleições de 2020, relata que sua primeira experiência como candidata a vereadora foi de aprendizado, mas que não sabe se pretende se candidatar novamente. Ela trazia como um dos pontos principais de sua campanha eleitoral a defesa dos direitos das mulheres, principalmente das mães solteiras e o empoderamento feminino. Por conta disso, seu slogan de campanha era “Mulheres jaguaribaribarenses também tem voz e vez”. Era comum que a jovem, uma das poucas mulheres do partido, fizesse referência ao tema durante seus discursos nos palanques políticos em que subiu.
Assim como três quartos das candidatas da cidade, Lohanne também não foi eleita, mesmo sendo a mulher mais votada do PSB com apenas 17 votos. O cenário político municipal de 2020 evidenciou que a maioria das candidatas femininas no município caminha a passos lentos, porém significativos na política local.
Os avanços podem ser percebidos, por mais que existam dificuldades dentro dos próprios partidos na pauta de gênero. Prova disso é que em 2021 a Câmara Municipal de Jaguaribara iniciou a legislatura com número de quatro vereadoras no seu quadro funcional, repetindo o recorde de mulheres da legislatura anterior. Das quatro vereadoras com atuação no quadriênio 2017-2020, três delas obtiveram êxito na busca por um novo mandato eletivo neste ano. Além de Damiana, foram eleitas Mazé Martins (PDT) e Mirian Bandeira (PDT). Jujua Calou (PDT) ingressa em seu primeiro mandato após o vereador eleito Gerrimar Barbosa (PDT) abrir mão do cargo para assumir a secretaria de Infraestrutura. Todas as mulheres eleitas fazem parte do mesmo partido, o PDT.
Os dados também mostram que Jaguaribara e Morada Nova são, respectivamente, as cidades com maior representatividade feminina nos 15 municípios do Vale do Jaguaribe. Em Jaguaretama e Alto Santo, das 11 vagas em disputa as mulheres ocuparam apenas uma em cada casa. Em Jaguaribe e Tabuleiro do Norte, duas foram eleitas dentre 13 vagas. Limoeiro do Norte elegeu apenas duas mulheres entre 15 cadeiras disponíveis. Já em Iracema e Russas nenhuma mulher foi eleita para o legislativo local. Confira a seguir a tabela oriunda do levantamento:
MUNICÍPIO | Nº VAGAS TOTAIS DAS CÂMARAS MUNICIPAIS | Nº DE VAGAS OCUPADAS POR VEREADORAS | PROPORÇÃO (EM %) DE MULHERES |
JAGUARIBARA | 9 | 4 | 44,44 |
MORADA NOVA* | 15 | 6 | 40,00 |
ERERÊ* | 9 | 3 | 33,33 |
SÃO JOÃO DO JAGUARIBE | 9 | 2 | 33,33 |
PEREIRO* | 11 | 3 | 27,27 |
QUIXERÉ | 11 | 3 | 27,27 |
JAGUARIBE | 13 | 2 | 15,38 |
TABULEIRO DO NORTE* | 13 | 2 | 15,38 |
LIMOEIRO DO NORTE | 15 | 2 | 13,33 |
PALHANO | 9 | 1 | 11,11 |
POTIRETAMA* | 9 | 1 | 11,11 |
ALTO SANTO | 11 | 1 | 09,09 |
JAGUARETAMA | 11 | 1 | 09,09 |
IRACEMA | 9 | 0 | 00,00 |
RUSSAS | 15 | 0 | 00,00 |
Fonte: TSE/G1 (2020)
*Câmara local ainda não atualizou o quadro de vereadores com base na eleição de 2020
Mesmo com a porcentagem mínima obrigatória de 30% de mulheres nos partidos, especialistas pontuam que a cota não tem contribuído para distribuir o poder de maneira igualitária entre os gêneros e efetivar a representação política feminina. Muitas candidatas são consideradas “laranjas”, não recebem sequer seu próprio voto e estão ali apenas para cumprir o coeficiente de participação feminina.
Nas eleições municipais de 2020, Jaguaribara teve apenas 12 candidaturas femininas à Câmara, o que corresponde a 32% das candidaturas gerais, equivalente a pouco mais do número mínimo exigido pela lei eleitoral. Dessas candidaturas femininas, sete obtiveram menos de 17 votos (0,2% dos votos válidos), segundo dados do TSE. Uma candidata teve apenas um voto, enquanto outra não obteve nem o seu próprio voto na urna. A candidata jaguaribarense que zerou na urna foi brutalmente assassinada a tiros em 15 de dezembro do ano passado. Apesar da candidatura registada, ela não subia ao palanque da coligação ou fazia campanha política nas comunidades.
Mas, o que podemos fazer para melhorar a representação das mulheres na política?
Segundo especialistas em direito eleitoral, para além da cota de gênero nos partidos, se faz necessário que os políticos e os partidos se comprometam com uma agenda mais igualitária e que, a população como um todo, consiga estimular uma mudança nesse cenário, desfazendo-se de estigmas e incluindo as mulheres nos espaços de tomada de decisão pública. Esse fator se faz mais necessários nas cidades onde as mulheres compõem a maior parte do eleitorado, como o próprio caso de Jaguaribara.
Em entrevista ao Jaguaribara em Foco, Livia Barreto, ex-candidata à vereadora e atual secretária de desenvolvimento econômico da cidade, relata um pouco sobre a sua experiência na política. “Na minha primeira candidatura, estávamos saindo de uma gestão onde tínhamos uma mulher como prefeita [Maria Emília Diógenes] e que deu uma certa força para as candidaturas femininas. Na segunda candidatura, que foi mais expressiva, havia mais mulheres concorrendo e existiu dificuldade de aceitação por parte dos eleitores tradicionais, dos mais velhos, mais pelo fato da resistência à renovação do que pelo gênero”, ressaltou ela.
A ex-candidata considera a representatividade feminina no parlamento como importantíssima. “Cada vez mais a representatividade da mulher na política se faz necessária, não só pelas questões em torno dos temas femininos, mas também pela relevância de trazermos um outro olhar para a política na tomada de decisões”, defendeu.

A vereadora reeleita, Damiana Negreiros (PDT), que nas eleições de 2016 bateu recorde histórico de votos, também nos relatou sobre sua experiência na política jaguaribarense. “Não vivenciei nenhum preconceito, mas enfrentei várias dificuldades, e acredito pelo fato de ser mulher essas dificuldades foram maiores”. Quando perguntada sobre a importância da participação feminina nas eleições, Damiana acredita que a presença feminina na política se dá “por sermos mais acessíveis às pessoas e gostarmos de fazer política com respeito e seriedade”.
A ex-candidata Lohanne Oliveira (PSB), relata que a sua participação nas eleições de 2020 foi em busca da luta pelos direitos das mulheres. “Principalmente para muitas que são como mães solteiras, só tem uma coisa a se falar que nós, jaguaribarenses, temos que correr atrás de tudo o que nós temos direito”. Lohanne acredita na renovação política e que devemos acreditar no melhor para todos. Apesar disso, a jovem não tem certeza se pretende se candidatar mais uma vez. "Eu não posso dizer que sim, também não posso dizer que não", titubeou ela ao responder.
Linha do tempo: mulheres na política de Jaguaribara
Pela primeira vez em 63 anos, Câmara Municipal será presidida por uma mulher
A nova mesa diretora para o próximo biênio da Câmara Municipal foi eleita em 1 de janeiro de 2021 e pela primeira vez em 63 anos de emancipação política a Casa terá uma mulher como presidente. A escolha contou apenas com uma chapa inscrita, encabeçada pela vereadora Mazé Martins (PDT) para presidência, Dedé Bode (PDT) para vice-presidente e Netinho de Daniel (PDT) e Mirian Bandeira (PDT), como primeiro e segundo-secretário respectivamente. A nova mesa diretora foi eleita por sete votos a dois; apenas os dois candidatos da oposição votaram contra.

Em seu primeiro discurso como presidente, Mazé destacou: “Em um universo historicamente patriarcal, onde as mulheres sempre foram colocadas como criaturas submissas, sei da importância de contribuir como mulher para uma Jaguaribara mais igualitária em direitos e deveres, começando pela equidade de gênero”. A nova presidente
também estendeu sua eleição às colegas vereadoras do partido. “Sei que meu empoderamento, também pertencente às colegas vereadoras eleitas, Damiana e Mirian, e servirá de inspiração para muitas mulheres que ainda poderão e deverão fazer parte da história política do nosso município”, disse ela.
Com a vitória de Mazé, essa é a primeira vez em 63 anos de emancipação política de Jaguaribara que a Casa terá uma mulher como presidente. Ela está há mais de 20 anos consecutivos atuando como vereadora no município e foi eleita cinco vezes seguidas nas últimas eleições (2005-2008, 2009-2012, 2013-2016, 2017-2020 e 2021-2024). A vereadora almejava o cargo desde o biênio 2019-2020, mas perdeu para Gerrimar Barbosa por 5 votos a 4 em meio a uma colisão interna de seu partido e clima de tensão e polarização na Câmara à época.